segunda-feira, 19 de setembro de 2016

O dia que conheci um abrigo

Infelizmente, não fui permitida de tirar fotos no abrigo. Guardei as fotografias no peito.


   Isabel mora em um abrigo, os pais são dependentes químicos e abandonaram-na. Isabel tem cabelos ondulados, sorriso largo e uma simpatia inigualável. Isabel tem pouco mais de dois anos. Isabel, quando me viu, gritou um "tia" como se me conhecesse e estivesse me esperando. Isabel apontou para mim, implorando um colo. Isabel me abraçou, fitando-me nos olhos, como se admirasse. Isabel, estou apaixonada por você.
   Ana Ester, ao contrário de Isabel, recebe visita da mãe à tarde. Ana Ester também tem a mãe como depende química. Ana Ester tem pouco menos de um ano, é moreninha e tem um cabelo bem fininho. Ana Ester me olhava com os olhos negros arregalados, como se tentasse entender o que eu tava fazendo ali. Ana Ester tem um corpo levinho, é difícil de fazer rir, mas ama que façam cócegas na barriga. Ana Ester chorou quando coloquei-a no berço. Ana Ester calou-se com o bico e ficou admirando a televisão. Ana Ester, estou apaixonada por você.
   Mariana não recebe a visita dos pais. Mariana tem pouco mais de três anos e uma irmã de quatro, no mesmo abrigo. Mariana só pode ser adotada junto com a irmã. Mariana tem cabelos cacheados, olhos puxadinhos e o sorriso mais lindo que já vi. Mariana queria sempre me abraço, um beijo, um carinho qualquer que fosse e já tava satisfeita. Mariana é branquinha, com uma barriguinha fofa e os bracinhos grossos. Mariana é uma criança que te deixa sem palavras. Mariana, estou apaixonada por você. 
   Eu poderia escrever inúmeros parágrafos, descrevendo cada criança que conheci naquela noite em que fui deixar minha avó no trabalho, na Casas Abrigo, localizado no bairro Cristo Redentor, em Fortaleza. 
   Diria que cada uma tem uma história que te faz refletir sobre a vida, sobre o improvável. Diria que as drogas afetam toda a família, pois matam, no sentido literal, deixam órfãos. Diria que deixar uma criança sozinha em casa, por mais que pareça inofensivo, pode destruir a vida de uma mãe, que terá o filho tirado dos seus braços. Diria que as brigas dos pais podem ser fatais. Diria que a gravidez na adolescência e o abandono é uma triste realidade.  
   Diria que fui tratada como uma estrela, uma celebridade: cada criança, de todas as idades, a todo custo, querendo minha atenção, um abraço ou, até mesmo, um tchauzinho com a mão. Diria que me agarravam, não queriam que eu fosse embora, me pediam para brincar. Diria que tive vontade de ter braços e força que me fizessem capaz de segurar várias crianças ao mesmo tempo, porque até ciúme tiveram, quando eu colocava no chão uma para pegar outra. Diria que até as meninas maiores, de mais de dez anos de idade, me abraçaram e sorriram como se eu já fosse amiga. Diria o quanto fiquei impressionada com a força de um abraço sobre uma pessoa. Diria que segurei o choro na frente de todos. Diria que chorei no caminho para casa. Diria que adotar é um ato lindo de amor. Diria que tomei a decisão mais importante da minha vida: futuramente irei adotar uma criança.

domingo, 10 de julho de 2016

Confissão




   Enquanto teus braços grossos me envolvem, desenhando, com os dedos mesmo, minhas curvas, eu jazo. Teus lábios me beijam como se os meus fossem os únicos da tua vida. Minha respiração falha, perco minhas forças e entrego-me até a hora de partir. Permiti-me, em uma noite, que você fizesse parte da viagem, sem questionar se era esse teu desejo. Depois dali, você me fez beijar com os olhos e sentir calor, mesmo batendo os queixos. 
   Apaixono-me, a cada encontro, pelo teu caos, pelo teu exagero, pela guerra dentro de si e pela visão de mundo. Ao encarar-me, sinto-me baleada, desarmada, atordoada. Teu corpo quente serve de escudo para os meus medos e nossas conversas são terapias para meus sentimentos. Saiba que minha aurora é você, que seu desgasto não me desgasta, que é meu remédio contra ansiedade. Não se prive disso, por favor.
   Desculpa-me se te chamo logo no dia seguinte. Teu cheiro desaparece das minhas roupas e eu sinto falta dele até cair no sono. Por favor, não me julgue pela coragem de estampar nas palavras o que eu guardo dentro da confusão do meu estômago. Fica do meu lado, não muda de barco. 
   Certas vezes, você me confrontou sobre a existência de outro rapaz na minha vida. Tive vontade de gargalhar, tamanho absurdo que ouvi. Tentei, confesso, ter outra presença, mas falhei. Tu já havias me entrelaçado, me encurralado, me machucado o suficiente para me permitir ficar.    
   Meu bem, estou ocupada sendo sua para me apaixonar por outra pessoa.

quarta-feira, 9 de março de 2016

Se entrar, fica




Distancie do meu exagero, das minhas fugas da realidade e da minha carência que só abraços são capazes de curar. Pode soar simples, mas não queira entrar nessa confusão sem tirar os sapatos. 
Não arrume minhas gavetas e tão pouco a minha cama. Não me tire para dançar e nem invente de trazer pizza para o jantar. Não coloque sua música em mim, não recite autores sem intenção. Mas se os fizer, fique e tenha paciência, por favor. 
Porque eu vou segurar na tua mão e te levar para conhecer minha visão de mundo. Farei caretas e piadas, na maioria das vezes para fugir dos momentos ruins, e, na sua caixa de emails, terá sempre um texto, assim, sem motivo, provando meu carinho por você.
Se realmente deseja entrar, eu até arrumo um espaço no guarda-roupa para você. Permitirei que você conheça minhas fantasias e segredos. Protegerei-te de ciúmes e serei sua melhor amiga. 
Mas seja intenso, está bem? Exagere, me proteja e não me abandone. Por favor, não me ignore, não guarde nada para si e, acima de tudo, não arrume suas malas de repente. 
Não guarde mais "e se", desperdício-os comigo.   

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

DIY: Como cuidar SÓ da sua vida

   Fui tirar o carro da garagem e encostei na árvore do vizinho (perdoa aí, porque a carteira é recente e tô dirigindo pra valer agora). Veja bem: ENCOSTEI. Bati? Não. Amassou? Não. Por quê? PORQUE EU SÓ ENCOSTEI. O vizinho DO LADO, que não tinha nada a ver com a história, viu. Cheguei em casa à noite e o assunto era a minha batida monstruosa que quase derrubou a árvore alheia e sabe-se lá Deus como não amassou o carro. Levei uns gritos maravilhosos e só fiquei calada olhando pro chão. Não dei um piu. Detalhe: esse vizinho fofoqueiro não fala com ninguém da minha casa (só quando responde ao bom dia da trouxa aqui, vulgo, eu). Agora, já tiro o carro e coloco na garagem tranquila e prestando BEM atenção (com o vizinho na varanda olhando escondido, se achando o James Bond, mas que, na verdade, dá pra ver a cabeleira branca de longe escondida). Olho feio pra ele na hora de sair? Não. Dou um sorrisinho e o bom dia de sempre.

Por fora:



Por dentro:




Inspirado nessas pessoas encantadoras, resolvi fazer um post de como parar de se importar com a vida alheia.


Passo número 1: Guarde as fofocas pra você.



Até entendo que fofoca seja construtiva em algumas situações, quando usada na finalidade de ajudar (por exemplo, Luana fez merda, mas não é sua amiga. Carol, entretanto, é sua amiga e amiga de Luana. Você faz fofoca pra Carol ajudar Luana, já que não tem intimidade suficiente para fazê-la). Fora isso, você precisa mesmo falar da vida alheia? Será que a sua é tão ruim assim pra ser ignorada? Fica a questão aí no ar.


Passo número 2: Questione a si mesmo se criticar é necessário.



Um fato X aconteceu. Você faz fofoca de tal fato e ainda expõe seu ponto de vista. Entenda: além de expor sua opinião, a pessoa que está te ouvindo também vai criar o próprio ponto de vista e, assim, na hora de comentar o episódio com outra pessoa, acontecerá o mesmo. O problema é simples: quando se expõe a opinião, ela, normalmente, é generalizada. Como assim? Fulano fez algo que o intitula como egoísta, mas Fulano não é egoísta, só foi porque a situação o fez ser. Logo, aumenta-se as histórias. Entendeu?


Passo número 3 e o MAIS IMPORTANTE: Questione a si mesmo se isso muda algo na sua vida.



Muda? Tem certeza? Não? Então cala a boca. <SIMPLES>

domingo, 17 de janeiro de 2016

Seios: uma relação de amor e ódio

   



   Que esplêndido são teus seios!
   São tuas armas mais perigosas
   e primorosos como as rosas.
  
   Fazem de ti provocante,
   tendo atenção dos indiscretos
   roubando olhares sem esforço.
   Tens a confiança no teu rosto.

   São teus e de mais ninguém.
   São como o calafrio que percorre o espinho
   e macios como veludo também.

   Num dia tá de bem,
   no outro se incomoda. 
   Nas conversas alheias se afoga
   e finalmente se acorda.
   
   Moça, usa tua sedução,
   esquece a insegurança,
   e confia no coração.

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Praia




   Mergulhei-me na tua raiva,
   respirei teu medo,
   nadei nos teus lábios,
   e me afoguei logo cedo.

   Você banhou minha alma,
   destruiu as mágoas
   e só trouxe calma.
   
   Me abandonou na praia, 
   assim, sem avisar.
   Deixou de ser mar 
   e em outros oceanos
   não me ensinou a nadar.   

terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Fim de ano




Bronzeou-se
cortou o cabelo
pintou a boca
cresceu as unhas
depilou a coxa
vestiu um sorriso
e amou-se.

Amou
foi amada
foi verdadeira
o tempo não deixou
teve tropeços
errou por medo.

Bebeu pra esquecer
riu na hora errada
arrependeu-se de beijar
duvidou das palavras
leu os olhares alheios
e dançou a noite toda.

Beijou os medos
brigou por egoísmo 
amou sozinha
fez promessas.
Não cumpriu.

Deu errado
deu certo
enraivou-se
respirou fundo
pensou.
Ano que vem, vai.